quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Coisas da política: O conflito em Roraima

(JB Online, 07Abr08)

Mauro Santayana


O que está ocorrendo em Roraima é mais grave do que o eventual confronto entre as forças policiais e os arrozeiros. Os governos recentes – entre eles o atual – se têm rendido às pressões internacionais que reclamam a autodeterminação das tribos indígenas sobre os territórios que ocupam. Ao aceitar a ação de missionários e de ONGs junto aos índios, sem o controle das autoridades nacionais, o governo permitiu que elas viessem a substituir o Estado nesses territórios. Elas atuam no Exterior – muitas delas subvencionadas pelos seus governos – sobre a opinião pública internacional. Desde o exterior, mediante vários organismos, incluída a ONU, pressionam o Brasil a que demarque áreas estratégicas de seu território, e cada vez maiores, como reservas indígenas. Além disso, seus agentes atuam atrevidamente nessas áreas, fechando-as e impedindo a entrada de autoridades nacionais.


Os sentimentos humanos nos fazem lamentar o processo de ocupação da América pelos europeus. Ele foi brutal, como se sabe, e mais brutal ainda nos espaços andinos e transandinos, que acolhiam civilizações sedimentadas, capazes de oferecer resistência aos invasores. A diferença dos meios bélicos permitiu o massacre de milhões de seres humanos, ao longo destes cinco séculos. No Brasil, só a partir de 1915 começamos a ter uma política indígena coerente, sob inspiração de Rondon.


A História não é um caminho de ida e volta. Por mais condenemos o processo de ocupação do território, não podemos fazer com que os portugueses reembarquem em suas caravelas, e deixem intocadas as terras do Brasil. Estamos aqui, e não podemos voltar, até mesmo porque não somos mais os que viemos. Somos etnia nova, constituída de todas las sangres, para lembrar a forte novela de José Maria Arguedas. Temos que conviver com o real, não com o ideal. Com todo respeito pelos que pensam de outra forma, este território, do Oiapoque ao Chuí, é nosso. É dos brasileiros que o conquistaram, conforme as regras daquele tempo. Os índios, que nele remanescem com sua forma de ser, estão sujeitos à jurisdição do Estado Nacional.


Alega-se que os nativos necessitam de espaço a fim de preservar hábitos milenares, como os do nomadismo. No mundo em que vivemos não há como manter santuários. Ainda que fosse possível isolar totalmente essas imensas glebas, seria absurdo aceitar que se transformassem em entidades nacionais autônomas. Salvo pequenos grupos, dispersos na selva, os índios manejam gadgets eletrônicos, dirigem veículos e, em alguns casos, pilotam aviões, operam computadores e aplicam dinheiro nas bolsas. Não voltarão a viver como seus ancestrais, no neolítico, quando não no paleolítico. Seria mais prudente ouvi-los, um a um, para que escolham entre permanecerem no paraíso já contaminado pelo álcool, pelas drogas refinadas, pela prostituição e pelo crime organizado – na exploração clandestina de recursos naturais – e se transformarem, de incapazes, em cidadãos de pleno direito. Mantê-los em seu estado primitivo, se isso fosse possível, poderia enternecer corações sensíveis e instigar teses universitárias, mas seria sempre uma violência a seu livre arbítrio. Os direitos humanos, entre eles o da liberdade individual, são de todos, e deles não podem ser excluídos os índios, que devem – mediante a escolarização – conhecê-los e os exercer.


Aos corações sensíveis e aos estudiosos se somam os sempre estranhos agentes de muitas ONGs, que fazem de discutível solidariedade um negócio, quase sempre grande negócio, quando não se trata de agentes descarados – ou embuçados – de governos estrangeiros.


O governo, que vem obtendo êxitos inegáveis, corre o risco de abrir caminho para que o território nacional venha a ser amputado, se continuar com sua acanhada política de fronteiras. Já cometemos imenso erro em aceitar resolução da ONU que admite a autodeterminação de áreas indígenas. O Estado não conseguiu evitar o conluio entre chefes tribais, mineradores e contrabandistas de diamantes na Reserva Roosevelt, que levou à chacina de dezenas de garimpeiros pelos cintas-largas. No Sul do Pará, os caiapós participam do garimpo de ouro e se associam aos contrabandistas de mogno.


Talvez conviesse convocar as Forças Armadas para intervir, por prazo indeterminado, nessas reservas, a fim de nelas impor a ordem e a justiça e promover o convívio entre os nativos e os brasileiros que ali se encontravam antes da demarcação. Nunca houve, desde Rondon – que lhes deixou sua doutrina – problemas maiores entre os militares e os índios. Os chefes militares os tratam com respeito e sabem que, em caso de necessidade, eles serão os principais defensores do território.


Grupo contrário à desocupação fecha pontes e isola centro do conflito em RR (O Estado de São Paulo, 07Abr08)


Anteontem, o grupo liderado pelo rizicultor Paulo César Quartiero fez uma cratera na cabeceira da ponte sobre o Rio Surumu, usando uma retroescavadeira, o que impossibilitou o tráfego de veículos. O outro acesso já estava bloqueado, depois que a ponte sobre o Rio Araçá foi incendiada.


A Polícia Federal garantiu que o isolamento de Surumu, epicentro do conflito, não compromete a execução da operação de retirada dos invasores.


Agentes da PF têm monitorado cada passo dos manifestantes com escutas em telefones e em aparelhos de radiocomunicação utilizados dentro e fora da terra indígena. Para finalizar os detalhes da retirada, chega hoje a Boa Vista o delegado Fernando Segóvia, que coordena a operação.


Até o fim da semana o restante dos policiais desembarcará, completando o efetivo de 500 homens. Eles terão à disposição cem veículos e três helicópteros - um com artilharia pesada.


A batalha pela terra também ocorre em Brasília, onde um grupo de produtores aguarda decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a suspensão da operação.

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